Praticamente chegamos à metade do ano e fui olhar minhas leituras até aqui. Como vários de nós, eu também gosto de montar listas ali por volta de Dezembro/Janeiro de todo ano sobre o que gostaria de realizar, entre elas as leituras que estão no radar. O objetivo inicial não é por um número específico de livros para ler, mas sim me organizar na intenção de ler mais do que no ano anterior. E dobramos a meta.
Também consegui inserir com mais frequência a leitura de livros de não-ficção junto aos de ficção. Gosto muito dessa mistura. Não consigo ler dois romances simultaneamente, por exemplo, me deixa confusa em para qual ir na hora de sentar para ler. Mas ler diferentes gêneros tem sido ótimo. Essa se tornou minha melhor forma de ler: uma média de um de ficção e um de não-ficção por mês, às vezes mais, às vezes menos, dependendo dos trabalhos e da disposição.
Essa coisa da quantidade é relativa, já que somos pessoas diferentes, com ritmos diferentes e, sem dúvida, com formas de ler diferentes. Para mim, enquanto escritora, leitora e professora de escrita, é essencial que eu leve as leituras com maior constância, afinal, faz parte da minha profissão. Ao mesmo tempo, é importante eu me lembrar de que ler é um prazer em primeiro lugar. Parar de analisar tudo e simplesmente embarcar na história.
Posso dizer que, para esse ano, também já dobrei a meta do ler por e com prazer: quase todos os livros de ficção que li esse semestre tiveram um poder imenso em me captar e me levar para a história, me fazendo esquecer de tudo para vivenciar aquela narrativa, chorar, rir, me distrair, no final aprender algo muito além de técnicas de escrita: aprender sobre a vida, sobre aquelas personagens e o seu mundo que, independentemente do quão diferentes possam ser de mim, nos encontramos na humanidade.
Diria que até agora, meu Top 3 melhores leituras do semestre ficou bem claro e são os seguintes:
Amada, de Toni Morrison
Vestígios do dia, de Kazuo Ishiguro
Puro, de Nara Vidal
Alguém me falou por esses tempos que há muito tempo não lia um livro de ficção. Essa pessoa passou anos focada em leituras técnicas/de produtividade ou de livros mais espirituais. Em outras palavras, pelo que entendi, livros que ela considerava “úteis”. E, quando retornou a um livro de ficção, ficou surpresa como a história fez com que ela refletisse sobre os assuntos da própria vida. Se encontrou, através da ficção, com pensamentos que ela buscava nos livros de não-ficção, alcançando percepções e entendimentos até mais profundos sobre si e sobre o outro à partir daquela leitura. Achei esse relato tão bonito, me lembro do brilho de surpresa nos seus olhos com aquela redescoberta da literatura de ficção.
No livro A arte de ler, a pesquisadora francesa, Michéle Petit, pesquisa exatamente os efeitos e o lugar da literatura e seu poder dentro da sociedade, em especial olhando para populações da América Latina. Ela nos lembra como a apropriação da literatura é desejável por vários motivos, porque quando a literatura penetra na vida da pessoa, ela a torna
“mais hábil no uso da língua; conquista-se uma inteligência mais sutil, mais crítica; e também torna-se mais capaz de explorar a experiência humana, atribuindo-lhe sentido e valor poético
(…)
a leitura engendra a fala, desencadeia o fio das associações, reativa uma atividade de simbolização, de narração. Permite colocar palavras em regiões dolorosas de si. E o que é escrito de modo belo incita ao compartilhamento com o ser amado”
Esse livro traz uma perspectiva social sobre o ato de ler bastante aprofundada à qual eu dedicarei, mais para a frente, uma edição inteira da newsletter para ele, mas como ainda estou no começo da leitura, fiquei refletindo sobre esse lugar de leitora que eu ocupo também.
Em Janeiro desse ano, eu escrevi na edição Eu me intimido por tamanho sobre como coloco outros livros na frente dos grandões que quero ler, adiando incessantemente a leitura, pois são os pesos-pesados da literatura, literal e metaforicamente falando. Com suas quase ou mais de mil páginas e ocupando o hall da fama dos clássicos, alguns estão sobre minha mesa há meses, me encarando. É um jogo psicológico que jogamos, eu e o livro, sem ninguém sair do lugar.
Notei que, nesses quase seis meses completos do ano, das 16 obras que li, a maioria são de livros contemporâneos e curtos. Vários não chegam às 150 páginas, alguns nem nas 100. Isso importa? Claro que não! Alguns desses inclusive estão entre os melhores livros que li nos últimos anos.
A ganhadora do Prêmio Nobel de 2022, Annie Ernaux, por exemplo, tem entre seus livros mais lidos obras que não passam de 70, 80 páginas. E são páginas consideradas espetaculares. Outro dia, li uma obra do escritor francês Édouard Louis, chamado Quem matou meu pai. Foi um livro que me impactou e, na versão ebook, tinha ali por volta de cinquenta páginas, mais ou menos. Mas passou o recado.
Analisando essas minhas leituras, me lembrei de uma espécie de simpósio que participei durante meu mestrado no Reino Unido. Entre as convidadas dos encontros, recebemos uma agente literária bastante relevante no UK. Perguntei a ela se as editoras levam ou não em consideração o tamanho do livro na hora de publicarem um autor. É claro que a gente desconfia, até sabe, mas eu queria uma resposta oficial. Ela disse que sim, dificilmente uma editora tradicional publica livros maiores de 350 páginas quando escritos por autores desconhecidos ou iniciantes, por questões mercadológicas. Essas questões mercadológicas sendo o custo de produção VS chance de vendas. Vale lembrar que publicar livros é um negócio baseado em retorno sobre investimento, como todo outro negócio da nossa era.
Pois estão aí os grandões sobre minha mesa comprovando que os clássicos a gente acha facilmente para comprar, uma vez que eles são quase garantias de vendas para os envolvidos na publicação. Nem por isso, são facilmente lidos de fato.
Enquanto escrevo essa news, tenho me encarando Ulysses (junto ao livro de apoio Ulysses Unbound, de Terence Killen) de James Joyce, que comprei na Irlanda, terra do próprio; Um defeito de cor, da mineira Ana Maria Gonçalves (esse é o livro mais jovem da lista); Jogo da Amarelinha, do argentino Cortázar; A montanha mágica, do alemão Thomas Mann, e o livro que vou levar para malhar bíceps na academia: Em busca do tempo perdido, do francês Marcel Proust, com suas quase 3 mil páginas. Esses serão meus Everestes do segundo semestre. Claro que não vou conseguir ler todos, mas quero, ao menos, iniciar nesse percurso. Se eu ler dois deles até o final do ano já ficarei feliz. Não é por eles serem grandes, mas é por eles serem livros que eu quero ler, simples assim, mas que por serem grandes (o menor tem umas 700 páginas e o maior mais de 2.500) ainda não comecei.
Vou usar da newsletter como um apoio também, meu próprio clube do livro (de uma pessoa só, talvez, e tudo bem hahaha) onde virei compartilhar das partes que estou lendo, percepções e como anda o ritmo do desafio.
Mas esse clube do livro de um não precisa ser só de um. Se alguém mais aí quiser entrar no desafio comigo, me fala! Vamos subir esses Everestes literários juntos, vendo o que descobrimos pelo caminho!
Ainda não decidi a ordem em que lerei-os porque são livros que estão no meu radar há muito tempo. Se alguém mais for entrar nessa, me manda mensagem, comenta aqui ou responda ao email e a gente escolhe juntos qual será o primeiro.
Admito que estou tendendo para o Ulysses, (minha edição é a da Penguin, traduzida por Caetano Galindo), mas só porque a Irlanda ainda está batendo muito forte no meu peito.
Até a próxima edição saberemos!
Beijos e boas leituras,
Cleu
Estou pensando em ler 'Um defeito de cor' no segundo semestre. Se tiver companhia, vai ser ainda melhor =)
Ahhhh meu Puro aí. Obrigada, minha querida ❤️ Adoro acompanhar suas reflexões.